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BURNOUT NO ESPORTE

  • Foto do escritor: Nicholas Somers
    Nicholas Somers
  • 18 de abr. de 2016
  • 6 min de leitura

"Este artigo foi desenvolvido por Daniel Alvarez Pires, Doutor em psicologia do esporte e exercício pelo LAPES (Laboratório de Psicologia do Esporte), UFMG."

Um atleta com grande potencial era atleta profissional de vôlei de praia. Entre as suas principais conquistas se destacam o bicampeonato do Circuito Banco do Brasil (2007 e 2010), seis títulos em etapa do Circuito Mundial, um campeonato brasileiro sub-21 e o bicampeonato mundial sub-21. Ao lado de seu parceiro, conquistou o quinto lugar nas Olimpíadas de Londres em 2012. No entanto, em fevereiro de 2013, aos 29 anos, este atleta decidiu abandonar a carreira esportiva. As justificativas para a sua decisão foram a falta de patrocinadores, a saudade da família e o excesso de lesões.

Segue abaixo um trecho da entrevista dada pelo atleta no dia do anúncio de sua aposentadoria [1]:


"Não tenho mais o prazer de treinar, de competir, por mais que me force a isso. Para mim, é sinal de que está na hora de repensar as coisas. Estive em Londres e vi o quanto a Olimpíada é fascinante. Foi um sonho que realizei. Pensei muito, mas não sei se chegaria aos Jogos de 2016."


O programa Sportv Repórter [2], exibido em abril de 2013, utilizou este caso para exemplificar o quanto o estresse pode ser prejudicial para a carreira de atletas de alto nível. Quando o estresse se torna crônico, pode surgir a síndrome de burnout.

Antes de abordar o burnout, é importante esclarecer o significado da palavra síndrome. Trata-se de um conjunto de sintomas associados a uma patologia. Por isso, considera-se o burnout como um fenômeno multifatorial, composto pela interação entre sintomas.

No contexto esportivo, o burnout é definido como uma resposta psicofisiológica de esgotamento exibida como resultado de esforços frequentes, às vezes extremos e geralmente ineficazes que visam satisfazer as demandas excessivas de treinamento e competição [3].

Trata-se de uma síndrome composta por três elementos centrais [4]: exaustão física e emocional, reduzido senso de realização esportiva e desvalorização esportiva.

Considerada a principal dimensão do burnout, a exaustão física e emocional está associada às intensas demandas dos treinos e competições. Sabe-se que tais demandas advindas da rotina atlética interferem no bem-estar físico, psicológico e social. Portanto, reações como ansiedade, tensão e estresse, além de cansaço físico e psicológico, representam essa dimensão.

A dimensão reduzido senso de realização esportiva é interpretada fundamentalmente como a insatisfação relacionada à habilidade e destreza esportiva. Exemplos dessa dimensão são a falta de progressos no desempenho atlético e percepções de falta de sucesso e falta de talento.

Por fim, a dimensão desvalorização esportiva se manifesta quando o atleta para de se preocupar com o seu rendimento e com o seu envolvimento dentro do meio esportivo. Entre as principais características dessa dimensão estão a falta de interesse, a falta de desejo e a falta de preocupação em relação ao esporte.

Quais as modalidades esportivas mais propensas ao surgimento do burnout? Trata-se de uma pergunta difícil de responder. Sabe-se que as modalidades coletivas e individuais apresentam diferentes características de ordens técnica, tática e psicossocial. Na perspectiva teórica foi desenvolvida a proposição de que os sentimentos inerentes à síndrome são geralmente menos notados em atletas de esportes coletivos. Isso se deve, principalmente, à divisão de funções e tarefas, ao maior suporte social advindo dos companheiros e ao maior número de relações interpessoais existentes nos esportes de equipe [5]. No entanto, estudo empírico realizado em jovens atletas suecos não confirmou a hipótese de prevalência de burnout em atletas de esportes individuais [6]. Portanto, não há consenso em relação às possíveis manifestações diferenciadas do burnout entre atletas de modalidades coletivas e individuais.


As principais causas do burnout são [7]:

- Altas demandas competitivas;

- Monotonia dos treinamentos;

- Dificuldades de relacionamento com o treinador;

- Interesses financeiros dos pais;

- Ausência ou reduzida vida pessoal fora do esporte;

- Decepção das expectativas iniciais com os resultados finais obtidos.


Dentre as principais consequências do burnout se encontram [7]:

- Redução dos níveis de energia;

- Aumento da suscetibilidade a doenças e distúrbios do sono;

- Sentimentos de depressão, isolamento e raiva;

- Percepções de sobrecarga, baixa realização e abandono.


Além das consequências descritas acima, constata-se que o abandono da prática esportiva, também conhecido como dropout, pode ser resultado dos efeitos prejudiciais do burnout. Atualmente, observa-se que jovens atletas que têm sido expostos a treinamentos excessivos durante muito tempo tendem a abandonar a modalidade.

De modo geral, há consenso em relação a algumas medidas que devem ser tomadas na prevenção do burnout, como a elaboração de cargas de trabalhos distribuídas equilibradamente ao longo da temporada, a diversificação dos treinos, rompendo-se com a monotonia do trabalho, a ênfase constante na motivação do atleta, evitando-se a saturação do indivíduo frente à atividade esportiva, e as sugestões de modificações na estrutura social do esporte contemporâneo, caracterizada pelo excesso de competições e viagens e afastamento do convívio com a família e demais pessoas significativas.

No âmbito do tratamento da síndrome de burnout no esporte, González [8] propõe uma estratégia de recuperação na qual, primeiramente, devem-se identificar as causas primárias que estão levando o atleta a padecer da síndrome e, com isso, eliminar qualquer tipo de causas físicas, técnicas ou de equipamentos (no caso de modalidades esportivas como a esgrima e o salto com vara), dando ênfase aos aspectos psicológicos. O segundo momento consiste em uma reprogramação psicológica, cujas vias de intervenção são duas: o descanso e a elaboração de um programa que acelere a eliminação do burnout. O descanso consiste na retirada do atleta do cenário competitivo, com os objetivos de romper com a atmosfera emocional que se gera entre os desportistas, afastá-lo das pressões oriundas dessa atmosfera e “recarregar as baterias” do indivíduo, facilitando o seu retorno às competições. Quanto à programação psicológica, o procedimento considerado mais eficaz é o restabelecimento de metas de curto prazo (uma ou duas semanas), metas essas que possam ser alcançadas, sirvam de incentivo à autoestima e, principalmente, sejam divertidas, contrastando com a monotonia dos treinamentos rotineiros e com o cansaço da temporada. Essa especificação dos objetivos pode se dar das seguintes maneiras: estabelecimento de objetivos de treinamento; estabelecimento de objetivos de rendimento; assessoramento emocional por parte de um psicólogo esportivo competente; e avaliação do tratamento.

O tratamento da síndrome também envolve o emprego de estratégias de enfrentamento do estresse, conhecidas como coping. Exemplos de coping consistem em ter uma postura mais positiva diante dos problemas relacionados ao contexto esportivo, procurar por suporte social (apoio dos companheiros de equipe, treinadores, familiares e amigos) e a elaboração de metas equilibradas entre curto, médio e longo prazo. Porém, Maslach [9] comenta que livrar-se de um problema negativo não é o mesmo que chegar a uma alternativa positiva. Nesse sentido, as intervenções para reduzir o burnout somente serão eficazes se levarem em consideração a retomada do engajamento da pessoa em relação à sua participação esportiva, visto que o engajamento é a antítese do burnout.

Portanto, é importante estar atento e avaliar continuamente as relações que você estabelece com a sua prática esportiva. Perguntas do tipo “estou me sentindo exausto?”, "tenho obtido a realização que havia planejado antes de iniciar no esporte?” e “apresento bom relacionamento com meus treinadores e companheiros de equipe?” podem ser úteis no reconhecimento da manifestação da síndrome de burnout. Concluindo, observa-se que, para um tratamento eficaz do burnout, é primordial que se detecte o que está levando o atleta a padecer da síndrome, analisando-se os fatores sociais, psicológicos e fisiológicos [10]. A partir de então, sugere-se o emprego do descanso, de reestruturação dos objetivos no esporte e da intervenção psicológica.

Referencias:

1. PEDRO Cunha anuncia aposentadoria do Vôlei de Praia aos 29 anos. Folha de São Paulo, São Paulo, 27 fev. 2013. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/esporte/1237776-pedro-cunha-anuncia-aposentadoria-do-volei-de-praia-aos-29-anos.shtml>. Acesso em 13 mar. 2014.

2. ESTRESSE O INIMIGO INVISÍVEL. Sportv Repórter, Rio de Janeiro: Sportv, 21 de abril de 2013. Programa de TV.

3. WEINBERG, R.; GOULD, D. Fundamentos da Psicologia do Esporte e do Exercício. Porto Alegre: Artmed, 2008. 4. ed.

4. RAEDEKE, T.; SMITH, A. Development and preliminary validation of an athlete burnout measure. Journal of Sport and Exercise Psychology, v. 23, n. 4, p. 238-306, 2001.

5. COAKLEY, J. Burnout among adolescent athletes: a personal failure or social problem? Sociology of Sport Journal, v. 9, n. 3, p. 271-285, 1992.

6. GUSTAFSSON, H. et al. Prevalence of burnout in competitive adolescent athletes. A qualitative analysis of burnout in elite Swedish athletes. The Sport Psychologist, v. 21, n. 1, p. 21-37, 2007.

7. GARCÉS DE LOS FAYOS, E. J.; VIVES BENEDICTO, L. Burnout y Abandono del Deportista de Alto Rendimiento. Em: ROFFÉ, M.; UCHA, F. G. (Orgs.). Alto Rendimiento, Psicología y Deporte: Tendencias Actuales. Buenos Aires: Lugar Editorial, 2005. p. 161-173.

8. GONZÁLEZ, J. L. Psicología del Deporte. Madrid: Biblioteca Nueva, 1997.

9. MASLACH, C. Entendendo o Burnout. In: ROSSI, A. M.; SAUTER, S. L. (Orgs.). Stress e Qualidade de Vida no Trabalho. São Paulo: Atlas, 2005, p. 41-55.

10. PIRES, D.; MARQUES, L.; BRANDÃO, M. R. Burnout no Esporte: diagnóstico e prevenção. In: BRANDÃO, M. R.; MACHADO, A. (Orgs.). Aspectos Psicológicos do Rendimento Esportivo. São Paulo: Atheneu, 2008, v.2, p. 117-134.


 
 
 

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